As 20 tendências ESG que vão guiar a forma como empresas fazem negócios no Brasil em 2022, segundo Ricardo Voltolini

Andressa Rovani | 3 jan 2022 Andressa Rovani | 3 jan 2022

Desde que Larry Fink, presidente da gestora de fundos BlackRock, afirmou em sua carta anual aos CEOs que sustentabilidade se tornaria um critério para avaliação de investimentos em 2020, o mundo corporativo mudou. No Brasil, o impacto foi sentido em 2021: as boas práticas ambientais, sociais e de governança ganharam relevância nos negócios, e ESG se tornou um termo necessário no dicionário dos executivos.

Se o ano que passou fez florescer a discussão, 2022 vai ser de expansão dessa agenda. A avaliação é do especialista em sustentabilidade Ricardo Voltolini, fundador da plataforma NetZero e CEO e consultor da Ideia Sustentável. Voltolini é também autor, entre outros livros, do recém-lançado “Vamos falar de ESG? Provocações de um Pioneiro em Sustentabilidade Empresarial” (Editora Voo, 2021).

“Estou otimista com relação à expansão do ESG porque não é mais uma discussão de nós contra eles, como era no passado, com as grandes ONGs verdes apontando o dedo para as empresas. Agora, são os próprios atores do capitalismo revendo como ele funciona, para tentar eliminar alguns defeitos que o capitalismo tem.”

Voltolini acredita que as discussões sobre o tema se encaminham para a construção de um ESG à brasileira, capaz de enfrentar os grandes desafios que o país impõe e que atenda às demandas de uma sociedade cada vez mais vigilante.

Neste papo com NetZero, Voltolini destaca 20 tendências da agenda ESG que devem guiar as boas práticas das principais empresas do país neste ano.

1 – O RISCO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS

As mudanças climáticas seguirão sendo o principal eixo de riscos ESG para os negócios. E a descarbonização terá um papel relevante, principalmente porque o carbono representará um custo crescente para as empresas.

A criação de um mercado de carbono internacional, discutida e aprovada na COP26, abrirá a possibilidade de compra e venda de créditos no cumprimento de metas de redução de emissões de gases efeito-estufa.

“O Brasil é, reconhecidamente, um potencial credor, mas há mais dúvidas do que certezas nesse cenário. Resta saber como e em que ritmo o mercado de carbono interno será criado”, diz Voltolini.

2 – FORNECEDORES IMPORTAM

Para cumprir metas de net zero, as empresas terão que incluir cada vez mais os seus fornecedores. Espera-se para 2022 que grandes empresas com metas net zero cobrem, por meio de critérios rígidos de seleção e fiscalização, que seus parceiros de cadeia de suprimento também reduzam emissões. “Não dá para cumprir meta olhando só da porta para dentro.”

3 – MAIS DO QUE ASSUMIR METAS, SERÁ PRECISO MOSTRAR COMO CHEGAR LÁ

As empresas devem assumir metas cada vez mais ousadas em redução de emissões. Essas metas serão transformadas em compromissos públicos. No entanto, com o aumento do interesse de investidores e consumidores, não bastará às empresas apenas comunicar metas. Elas precisarão mostrar os seus planos de ação, isto é, que mudanças desejam fazer em seus processos, produtos e modelos de negócio para atingir os compromissos de neutralização de carbono. “A ideia é menos storytelling, mais storydoing. Chega de só falar.”

4 – DESINVESTIMENTO EM QUEM NÃO TEM PLANOS PARA ENERGIA RENOVÁVEL

O recado dado por Larry Fink, da Black Rock, numa de suas primeiras cartas abertas, mudou a visão de “private equity” em todo o mundo e deve continuar influenciando muito os investidores. Seguiremos assistindo a um processo de desinvestimento em empresas que insistirem em não ter projeto para a substituição das energias baseadas em combustíveis fósseis.

“Apesar da COP26 não ter tratado da eliminação do carvão, ainda temos no mundo muita energia suja. As empresas que não tiverem planos para passar da fonte fóssil para a renovável serão desinvestidas, que é uma forma que o mercado encontrou para dizer que as coisas precisam ir para outra direção.”

5 – MAIOR DEBATE SOBRE JUSTIÇA CLIMÁTICA

Há um consenso global no mercado financeiro, fortalecido após a COP26, que o capital deve migrar com força para a ideia de net zero. Do mesmo modo, existe uma percepção de que não se afastará o risco climático se não houver um esforço de financiamento da adaptação dos países mais vulneráveis.

“Essa é uma das grandes derrotas da COP26: não houve acordo para a criação de um fundo de auxílio aos países mais vulneráveis”, diz Voltolini. A ideia de justiça climática agora ganha força. Governos tenderão a olhar com maior atenção para investimentos em mecanismos de adaptação às mudanças climáticas –e um caminho para isso será a emissão de títulos verdes.

6 – CONVERGÊNCIA DAS ESTRATÉGIAS ESG E DE NEGÓCIO

Em 2022, mais empresas tomarão a iniciativa de construir estratégias de ESG, com diretrizes claras, metas, KPIs e compromissos públicos. Espera-se para o futuro uma convergência cada vez maior entre as estratégias de ESG e as de negócio.

“Talvez essa seja a mais importante mudança de lógica advinda da ascensão do ESG. Antes era um tema de escolha, tático e departamental. Passou a ser um tema mandatório, estratégico e do CEO e Conselho de Administração.”

7 – AUMENTO DO INTERESSE DOS LÍDERES EM ESG

Ainda há muito espaço para expansão neste assunto. Pesquisa recente da CNI indica que 72% dos líderes brasileiros admitem estar pouco ou nada familiarizados com ESG; no entanto, 81% afirmam que ESG é importante ou muito importante. Além disso, 63% dizem que vão aumentar investimentos em ESG nos próximos anos. “ESG vai crescer no Brasil e sair desse estágio de gestão para outro mais estratégico.”

8 – REMUNERAÇÃO VARIÁVEL ATRELADA A ESG

Na mesma perspectiva, deve crescer o número de empresas que condicionam a remuneração variável a resultados de ESG. Pesquisa recente do Instituto FSB indica que 16% das empresas brasileiras adotam essa prática. “É uma ferramenta importante para mostrar o compromisso da empresa com ESG.”

9 – MAIS MEMBROS EXTERNOS EM COMITÊS

Para Voltolini, observaremos neste ano um crescimento na participação de membros externos em Comitês de Sustentabilidade/ESG nas empresas. “Eles têm o papel importante de traduzir os grandes desafios de ESG da empresa para tomada de decisão do conselho de administração. Este tipo de instância adiciona valor de transparência à governança do tema.”

10 – CONSELHOS ESTARÃO GUIADOS PARA O PROPÓSITO

Antes pouco interessados, os conselhos de grandes empresas devem ampliar, em 2022, a atenção para a agenda ESG.

“Espera-se dos conselheiros que estabeleçam uma cultura orientada por propósito, definam metas e métricas capazes de acelerar a agenda e integrem os três temas às principais decisões de negócios. Esse movimento é novo, ganhou força em 2021, e deve continuar crescendo porque ainda tem muito a ser feito.”

11 – BRASILEIRO ESTÁ MAIS INTERESSADO NO IMPACTO DOS PRODUTOS QUE CONSOME

Brasileiros estão mais críticos em relação ao desempenho socioambiental das empresas –essa é uma tendência que ganhou corpo com a pandemia. Pesquisa recente do Instituto Akatu, em parceria com a Globescan, mostra que 50% dos brasileiros consideram que a falta de contribuição das empresas impacta numa vida menos sustentável, enquanto a média mundial no índice é de 34%.

“Com a pandemia, o tema pegou uma rota de crescimento. Os millennials e a geração Z são naturalmente mais críticos em relação à origem e ao impacto dos produtos. É uma tendência que veio para ficar”, diz Voltolini.

12 – RASTREAMENTO DA CADEIA DE VALOR

Recentemente o bloco de países europeus anunciou que só vai comprar produtos oriundos do agronegócio brasileiro se os exportadores comprovarem que, na origem, não houve desmatamento da Amazônia. Um desses exemplos é o setor de proteína animal: importadores querem saber, por exemplo, se o frango ou o porco que estão comprando não foram alimentados com ração oriunda de plantações de soja na floresta amazônica. Em relação à carne bovina, os consumidores europeus têm interesse crescente em saber se, antes do abate, os animais não pastaram em área desmatada da Amazônia.

“Cada vez mais, as empresas brasileiras precisarão estabelecer posicionamento ambiental, fazer rastreamento da cadeia de valor e assegurar medidas de mitigação das mudanças climáticas.”

13 – IGUALDADE DE GÊNERO E EQUIDADE RACIAL SEGUEM EM ALTA

O tema diversidade e inclusão deve ganhar status cada vez mais estratégico nas companhias. Ações pontuais cederão espaço a estratégias mais consistentes de gestão de talentos orientada por esses princípios. “Temas como gênero (mais mulheres em C-Level em conselho) e equidade racial (mais negros em posições de chefia) seguirão em alta. E veremos metas mais ambiciosas e métricas mais rigorosas para medir esse impacto no ambiente de trabalho.”

14 – EXPANSÃO DOS “ESG BONDS”

Bancos de investimento e de varejo terão papel cada vez mais relevante na elaboração de fundos mais sustentáveis e na integração de ESG nas estratégias de negociação de dívidas. Os chamados “green bonds” e “ESG bonds”, que consistem no atrelamento da dívida a metas socioambientais, cresceram em 2021 e tendem a seguir na mesma rota de expansão em 2022.

15 – MAIS TRANSPARÊNCIA SOBRE SUSTENTABILIDADE

Com o aumento do interesse por ESG, deve crescer também o rigor na divulgação dessas informações no mercado. A ideia é melhorar transparência, evitar o uso do termo de modo impreciso e irresponsável. Mais do que isso, encorajar códigos de conduta que se baseiem em fatos, evidências e avaliações mais objetivas.

Recentemente, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) incluiu questões de ESG em seu “formulário de referência”, um documento obrigatório para empresas de capital aberto, base para consulta de investidores. Em 2021, a B3 mudou também as regras do ISE visando conferir mais transparência à divulgação dos dados.

16 – É HORA DAS AGÊNCIAS DE RATING

Empresas brasileiras devem recorrer cada vez mais às agências de rating ESG para referendar suas estratégias, para mostrar que estão vigilantes quanto aos riscos e para tornar mais crível a comunicação do seu progresso na agenda dos temas ambientais, sociais e de governança.

“Isso já aconteceu em 2021, com empresas reportando resultados segundo ratings bastante respeitáveis. Já se fala na necessidade de uma unificação de modelos para que as empresas possam seguir um modelo único que permita comparação entre empresas.”

17 – MAIS INVESTIMENTOS EM INNOVABILITY

A inovação para a sustentabilidade seguirá em movimento de expansão, com ênfase no crescimento das chamadas greentechs ou ESGtechs –startups cuja soluções podem apoiar companhias na solução de dilemas de ESG— como gestão de resíduos, uso de água e energia, cultivo do solo, controle de desperdício, proteção da biodiversidade e redução de e missões de carbono. Também devem crescer os labs empresariais com foco em ESG, assim como o investimento em sistemas de open inovation orientados para desafios socioambientais.

18 – CULTURA ORGANIZACIONAL ORIENTADA PARA ESG

Mais empresas vão investir na formação de uma cultura organizacional orientada por ESG. Para isso, devem treinar e desenvolver competências relacionadas a questões ambientais e de governança. Surge, então, um novo tipo de liderança, a liderança sustentável, mais cuidadora, mais ética, mais inclusiva e mais ecocêntrica.

“Esse tema apareceu muito forte no Fórum Econômico Mundial e, aqui, estamos começando a observar a preocupação em formar essa liderança.”

19 – EMPRESAS ASSOCIADAS A CAUSAS

Em 2020 e 2021, houve um movimento em que empresas associaram suas marcas a causas importantes da sociedade brasileira, como a diversidade, por exemplo. As empresas estão cada vez mais atentas às demandas da sociedade.

“Durante a pandemia, algumas marcas cresceram por demonstrar apoio efetivo à população. Recentemente, temos visto o caso de empresas retirando suas marcas de programas apresentados por apresentadores homofóbicos, racistas, contra a ciência e cultuadores da intolerância. Esta tendência deve crescer nos próximos anos.”

20 – AUMENTO DO INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO ESTRATÉGICO

Uma empresa impacta a região ao seu redor de forma positiva e negativa. As empresas têm investido até hoje em compensações, mas, agora, o que se tem exigido não é mais uma “política de boa vizinhança”, mas de investir no desenvolvimento humano das comunidades impactadas pelo negócio.



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