“Para serem absorvidos pelo mercado, refugiados precisam aprender português”, diz diretora do Einstein

Mariana Sgarioni | 18 ago 2023
Miriam Branco, diretora executiva de RH do Hospital Albert Einstein
Mariana Sgarioni | 18 ago 2023

Como reconstruir uma vida destroçada pela guerra em um lugar tão distante, que fala um idioma tão diferente? É este o sentimento dos refugiados afegãos ao chegarem no Brasil. Para abrir uma primeira porta – entre tantas outras -, o Hospital Albert Einstein, de São Paulo, teve a ideia de ministrar aulas de português para estas pessoas. Com duração de um ano, o projeto conta hoje com 20 alunos, é 100% gratuito, e faz parte do programa de empregabilidade para pessoas em situação de refúgio e imigrantes da instituição.

A grave crise humanitária no país asiático provocou um novo fluxo migratório para diversas partes do mundo, inclusive o Brasil, que tem recebido cada vez mais refugiados. Desde janeiro de 2022, mais de 400 afegãos entraram no país pelo Aeroporto de Guarulhos. Muitas famílias acabam ficando dias acampadas em situação vulnerável, com a presença de mulheres, crianças e idosos de até 100 anos.

“Como área da saúde, devemos estar preparados para atender outras nacionalidades. Somos pessoas que tratam de outras pessoas. Precisamos ouvir a todos. E isso não se faz atrás de uma mesa, nem lendo livros: a gente só aprende os costumes e a cultura de outros povos se chegarmos perto, se estivermos próximos”, observou Miriam Branco, diretora de RH do Einstein.

Ela conta que o curso de português surgiu a partir do contato que o hospital teve com um médico afegão. Assim como ele, havia outros profissionais qualificados, mas que mal conseguiam se comunicar – muito menos trabalhar em suas áreas. “Pensamos: assim como este médico há diversas pessoas aqui que poderiam trabalhar conosco. Mas primeiro eles precisam saber falar português”, contou a executiva.

UMA NOVA CHANCE

De largada, mesmo sem saber falar português, dois profissionais foram contratados para trabalhar no Einstein. Ambos falam apenas inglês, por enquanto, e a instituição se adaptou às novas necessidades.

“A maior dificuldade tem sido a adaptação cultural. É um aprendizado para todos nós. Eu não preparo só as pessoas que vêm de fora, eu preparo também a equipe aqui dentro para recebê-las”.

Atualmente o Einstein conta com 55 funcionários refugiados, entre afegãos, haitianos, angolanos e venezuelanos. Eles fazem parte de um amplo programa de inserção profissional – no ano passado, a organização formou a primeira turma de capacitação em Ciência de Dados para refugiados, em parceria com a Toti Diversidade. Dos 26 alunos que concluíram o curso, 15 foram empregados, sendo 12 pelo Einstein e 3 em outras organizações. “A área da saúde não é só composta por doutores. Temos toda uma área operacional importantíssima. Oferecemos graduação, cursos técnicos e treinamentos para que estas pessoas tenham uma oportunidade de carreira aqui dentro”.

APOIO DAS LIDERANÇAS

De acordo com Miriam, em 2019, o presidente do hospital anunciou um manifesto pela diversidade, equidade e inclusão. A partir deste momento o assunto tornou-se institucional – e que envolve diretamente as lideranças. Frequentemente há almoços promovidos entre refugiados e a diretoria da instituição, por exemplo.

“Uma moça africana que trabalha na nossa cozinha sugeriu diretamente ao nosso CEO que contratasse mais refugiados. Ela contou a ele que os refugiados passam o dia nas ruas procurando emprego, pois não podem ficar nas casas de acolhimento durante o dia. Se chove, ficam na chuva porque não tem para onde ir. Essas pessoas só querem trabalhar”, contou a executiva.

A convivência com refugiados, especialmente aqueles com uma cultura tão diferente da nossa, abre horizontes e perspectivas. Segundo Miriam, os momentos de superação que estas pessoas passaram trazem uma força importante e um exemplo para ultrapassar obstáculos. “Todo mundo sai ganhando. As equipes se fortalecem, muitas pessoas acabam achando seus problemas menores diante das histórias que passam a conhecer. Diversidade é isso: é conviver junto e não em grupos separados, cada um defendendo sua própria causa. Outro dia ouvimos de uma colaboradora: finalmente sinto que fui, de fato, incluída”.



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