Com ingredientes vindos direto do produtor, a Liv Up coloca a sustentabilidade no centro do negócio e quer inspirar outros players

Maisa Infante | 31 maio 2022
Pedro Martins, da Liv Up. (Foto: Divulgação)
Maisa Infante | 31 maio 2022

Comida congelada é prática e ajuda o dia a dia de muita gente. Foi pensando em oferecer refeições congeladas saudáveis que a Liv Up, startup fundada em 2016, encontrou o seu nicho. 

A empresa nasceu em São Paulo da ideia de dois amigos, Vitor Santos e Henrique Castellani. Os principais produtos são packs com proteína, carboidratos e vegetais prontos e congelados que o consumidor pode combinar a seu gosto. Há também sobremesas, sopas, salgados e marmitas já prontas. Ao todo, são 120 produtos no portfólio. “Nosso objetivo é fazer cada vez mais pessoas comerem bem”, diz Pedro Martins, gerente sênior de Inovação e Sustentabilidade. 

Todas as refeições vendidas pela Liv Up são produzidas na cozinha industrial localizada em Aldeia da Serra, bairro de Santana de Parnaíba, na Grande São Paulo. Da fábrica, as refeições são levadas para os 12 centros de distribuição da empresa e, a partir deles, distribuídas para os consumidores. 

Por dia, são vendidas cerca de 1.300 refeições em 50 cidades do Brasil, principalmente capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Brasília, Goiânia, além de algumas grandes cidades como Campinas e Ribeirão Preto, ambas em São Paulo. Para colocar essa estrutura de pé, a empresa conta com 500 funcionários.

MODELO INCLUI COMPRA ACORDADA DE PRODUTORES DE HORTIFRUTI

A Liv Up trabalha para manter a sustentabilidade no centro do negócio, independentemente do tamanho da produção. Uma das iniciativas nessa direção é a compra dos vegetais diretamente dos produtores. Hoje, 80% dos hortifrutis saem diretamente do campo para a fábrica, sem passar por intermediários. “É uma forma de integrar a cadeia e fazer com que ela seja mais eficiente e mais curta. Se queremos de fato construir uma marca forte, que gera impacto positivo, não faz sentido comprar dos distribuidores. É preciso ir direto ao fornecedor”, diz Martins. 

A maior parte – 70% – dos produtores parceiros faz o manejo sustentável da lavoura, sem uso de agrotóxicos e produtos químicos, e atua no sistema chamado plantio dedicado, pelo qual a Liv Up se compromete a comprar a produção acordada com cada produtor. Neste sistema, a Liv Up calcula o volume de produtos que será necessário para suprir a demanda ao longo do ano e vai em busca dos produtores que podem fornecer o necessário. Cerca de 30 agricultores fazem esse trabalho.

O desafio é lidar com as variações de mercado, na demanda dos consumidores ou na produção, que podem gerar excedente ou ter um volume menor do que o esperado. Para esse controle, a Liv Up tem uma agrônoma que visita as propriedades periodicamente e acompanha o trabalho no campo para entender como o plantio está se desenvolvendo e se a previsão de colheita está no caminho esperado. 

Ainda assim, as oscilações acontecem mas, com a experiência adquirida ao longo dos anos e o volume demandado pela empresa, é possível gerenciar essas questões para que o resultado final seja bom para todos. “Em geral, um agricultor nos fornece pelo menos três matérias-primas. Então, mesmo que seja preciso mudar um pouco o planejado, se na média fizer sentido para o agricultor e para nós, a conta fecha. Temos uma gordurinha pra brincar no que deu errado”, diz Martins. 

EMPRESA BUSCA VALORIZAR A CADEIA DE PRODUÇÃO

As vantagens do plantio dedicado estão relacionadas ao impacto positivo que a empresa quer gerar. Do ponto de vista do agricultor, é uma forma de ajudá-lo a ter garantia de renda, já que a Liv Up compra do volume acordado. Há, inclusive, a possibilidade de a empresa fazer um adiantamento de até 10% para os agricultores como forma de ajudá-los a investir na produção que está por vir. 

“Muitos usam esse recurso para comprar insumos, sementes, contratar mais pessoas. Já teve agricultor que deu a entrada no financiamento de trator com esse valor. Conseguimos bancar isso porque sabemos que o agricultor vai colher os produtos e nos entregar.” 

Hoje, segundo Martins, a renda média dos agricultores que trabalham no sistema de plantio dedicado está em R$ 15 mil e, de maneira geral, a renda do agricultor no Brasil é de R$ 3 mil. Essa garantia de compra gera mais estabilidade para os produtores e também contribui para um manejo cada vez mais sustentável da terra. Há dois anos a Liv Up trabalha com cerca de 30 famílias e aumentou a produção no período. “Isso tudo parte da premissa de que um pedaço de terra produz muito vegetal. Então, você não precisa de tanta terra para ter um volume representativo de hortifruti.”

Para a Liv Up, o plantio dedicado traz uma relação de confiança, a garantia de produtos frescos e saudáveis na linha de produção e, também, uma diferenciação da marca frente aos concorrentes. 

Ainda existe o desafio de buscar a máxima sustentabilidade possível com outros fornecedores, como os de grãos, carnes e laticínios. Como são segmentos que apresentam mais dificuldade para se conseguir comprar diretamente de quem produz, a busca da empresa é sempre buscar menos intermediários para se manter na premissa de encurtar a cadeia. 

“Quando olhamos para os fornecedores de um modo geral, buscamos essa desintermediação. Seja na produção de grãos, castanhas, farinhas, a gente busca cada vez mais comprar de quem está produzindo ou processando, justamente para ter uma relação melhor, quase como um plantio dedicado, mas com mais jeito de um planejamento de compras.”

O DESAFIO DE RECICLAR EMBALAGENS

No modelo de venda da Liv Up, a venda de refeições congeladas demanda o uso de embalagens plásticas. Pela lei, embalagens que entram em contato direto com os alimentos não podem ser feitas com plástico reciclado.

Para que essa parte do negócio também seja o mais sustentável possível, a empresa fez uma parceria com a eureciclo. Desde o segundo semestre de 2021, essa porcentagem triplicou e hoje 100% do plástico utilizado no negócio é compensado. A eureciclo calcula o volume de plástico utilizado pela Liv Up e, por meio da compra de créditos de cooperativas, garante a reciclagem equivalente ao volume de plástico comercializado pela empresa. “É uma forma de fazermos a nossa parte. Mas entendemos que é uma solução parcial, porque não estamos resolvendo, de fato, o nosso problema”, diz Martins. 

Paralelamente a isso, a startup busca, sempre que possível, usar materiais mais sustentáveis nas embalagens. Em alguns produtos, como sobremesas, pizzas e saladas, são utilizadas embalagens de papel. Já os packs usados para congelar as refeições, por exemplo, possuem cerca de 20% de plástico verde, feito a partir da cana de açúcar. A diferença para o plástico feito a partir do petróleo é que a origem é uma fonte renovável e a pegada de carbono é menor. Porém, o problema do descarte continua o mesmo. 

“É melhor do que o plástico de petróleo. O ideal seria um produto vegetal biodegradável, que pudesse ser colocado em uma composteira sem gerar problema para o meio ambiente. Mas, hoje, ainda não temos tecnologia que atenda à nossa necessidade.” 

PROJETO-PILOTO AVALIA LOGÍSTICA REVERSA

Ainda na seara do lixo que o consumo dos produtos da Liv Up gera, a empresa decidiu, em 2021, fazer um projeto-piloto para recolher esse material e encaminhá-lo à reciclagem. A parceria foi feita com a GreenMining, que disponibilizou coletores em 40 condomínios de São Paulo onde se concentram os maiores consumidores da marca. Durante 7 meses esses consumidores puderam levar o plástico – não só da Liv Up, mas de qualquer outra marca – até esses coletores e a GreenMining ficou responsável por recolher e destinar à reciclagem. 

A ideia era testar a logística reversa, mas a conclusão foi de que a estrutura é muito cara e atinge poucas pessoas. “Dificilmente atingiremos 40% da nossa base nesse modelo. Na minha leitura, o que faz muito sentido é ter uma estrutura compartilhada, já que coletamos embalagem de todos os tipos. Se juntarmos outras empresas para diluir esses custos fixos, é bem possível escalar o projeto”, avalia. 

O modelo não será implementado, mas a ideia é seguir pensando e pesquisando o assunto, já que a sustentabilidade é um caminho que passa pela experimentação e também pela educação. 

Hoje, segundo o executivo, a sustentabilidade ainda não é um fator decisivo de compra, o que faz com que menos empresas optem pelo caminho de gerar mais impacto positivo. Mas está em curso um processo de intensificação desse movimento, segundo ele. E a Liv Up – que em cinco anos recebeu R$ 328 milhões em investimentos em 3 rodadas diferentes – quer justamente estar à frente e liderar essa mudança.. 

“Se cada vez mais clientes valorizam a sustentabilidade, mais empresas vão querer fazer parte disso. E queremos mostrar que é possível ter um produto bom, saudável, com preço competitivo e ainda assim gerar impacto positivo. É aí que acreditamos em liderar essa transformação e inspirar outras empresas para que seja uma realidade cada vez mais forte.” 



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